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Joyci Viegas

(gosta da imagem do pai lendo e fumando e de chinelo de couro, lendo no sofá com um armário de livros atrás dele e ela sentada do lado ou deitada no chão observando ele)


JOICY: Posso falar...[por favor] eu tô, me vem, tô tentando pensar essa memória dos meus pais, lendo assim...né, e eu não acho assim... eu, eu, não me vem essa, esse momento de leitura, nem vó, nem meus pais, aí...tentando entender, né, é...na época que eu era criança, meus pais eram militantes do Partido Comunista, meu pai sindicalista, minha mãe era militante de bairro...e tudo era muito... eles eram super radicais, ateus e... a vida é isso! [eufóricos] é, e... eu num tive uma infância muito cheia de...que eu trago pros meus filhos, né. Essa coisa de, ler, eu leio muito com eles, conto histórias, eu num tive, pra mim, e eu vejo isso muito com meu pai com a minha filha, ele chega pra ela “Deus num existe!” na lata! [risadas, nem prepara...] eu, pai, por favor... coisas assim, meu pai ele sempre foi muito direto, minha mãe ela na época ela era ateia? [ateia] hoje já não, né, ela é espírita hoje e tal...mas...eu me lembro assim, de, de, dos livros, do meu pai sempre lendo muito, fumando muito e lendo e fumando e lendo, isso me vem muito, me remete muito, reuniões em casa e eles, eu sempre lembro de tá, ter tensões, eu nasci em 85, final da ditadura, né, eles, eles, preocupados, minha casa vivia cheia de gente, cheia de reunião, e eu lembro é, quando eu criança eu correndo no meio desse povo e eles brigavam e eu num entendia o que que, eles num tinham um cuidado de nada assim, a gente ficava lá assim, convivendo com eles e aí meu pai sempre lendo, tinha, ele tinha um armário assim cheio de livros, fumando e lendo, ele tinha uma sandália de, de couro, aí eu lembro dele sempre assim, assim {balançando os pés} e fumando e lendo, lendo [risadas] é a lembrança que eu tenho dele! E eu passava pra lá, passava pra cá e ele lia, ele só lia e num tinha uma interação, ele só falava de política, política. Eu ficava ali olhando, né, que que será que ele tá tão bravo?! Que que é que tá acontecendo e ele sempre falou muito bem, eh... e aí minha mãe, ela, fez Psicologia, meu pai fez três graduações , num formou, nunca deu conta de lidar com a academia, ele sempre criticou muito até teve muita dificuldade de formar, que ele sempre questionou muito esse conhecimento e num sei que... ah, que vocês não sabem de nada... ele ia sempre, teve dificuldade de se adequar a essas pressões da academia e tá, ele fez Economia e fez Filosofia e fez História e largou tudo e ai, e hoje ele trabalha na Saneago, isso e sempre militou como sindicalista. E sempre leu, né, lá em casa a leitura... e sempre falou pra gente ler, livros assim...Marx, mesmo! [risadas] o Manifesto [o Manifesto Comunista! risadas] num tinha nada de, nada de [história infantil! risadas] ele dizia você tá muito velha já, e eu pai, né, a gente leu o Manifesto cum treze anos! [com 13 anos você tem que ler o Manifesto Comunista!] [Que maravilha!] e aí, eu tive uma grande dificuldade de formar, meu irmão mais velho teve dificuldade de formar e o mais novo também! Porque ele, ele, meu pai sempre teve uma fala muito provocadora e sempre incentivou a gente a questionar tudo e isso, cria, cria um pouco de problema mas ajuda em muita coisas [Com certeza!] [Não se submeter aos ao sistema] É... [o sistema acadêmico é muito fechado] É... ele critica muito, eu como professora, né, eu, eu hoje em dia eu, pensando sobre essas memórias, né, eu tenho essa fala muito provocadora, meu pai sempre foi muito provocador, mas isso aí que você está falando e num sei que, de onde você tirou e... ele sempre, ele tem uma base material...materialismo histórico mesmo, assim, na prática, aí, ele sempre me cobrou isso como professora, eu tô, que que você tá fazendo com seus alunos, que você...sempre provocando, é o jeito dele, assim, né, de, de falar e eu, eu, lido muito com os meus alunos assim, eu vou provocando, questionando, e eles vão falando, falando, vão aprendendo a... nem todos assim, não dá tão certo assim, essa é, um pouco do que eu aplico em sala de aula. Minha mãe, ela também é, muito mais radical que o meu pai, na época, é...mas ela era, meu pai era muito no discurso, e ela na prática assim, de, de ser muito feminista mesmo e num tem que... e muito, lutando, ela era militante de bairro e ela militava em creche, com a meninada, sempre tinha muita criança, sempre ela tava defendendo alguém prejudicado, que num tinha vaga na creche, e eu lembro sempre disso, ela sempre me levava pra esses lugares, e ela foi dona de uma escola, e aí, e aí eu lembro que foi a primeira escola que eu entrei, que eu estudei, e eu por ser ‘dona da filha da escola’ lê-se, filha da dona da escola, ela sempre me prejudicava assim, eu num podia ser nada...[risadas] nas festas, eu queria ser a, noivinha da festa [Não!] Não, num pode! [Você é filha da dona, vai dar problema!] É, e hoje eu entendo isso, mas na época eu ficava assim horrorizada! Ai, nossa, mãe, deixa eu ser a noivinha... “Não! Você é a única que não vai ser, não vou repetir!” [risadas, Você nem casa! Você é feminista! Noiva muito menos, pra começo de conversa...risadas] E ela tinha, nunca me deixava ser nada, mas a escola, essa escola dela, eu lembro que tinha muitos rituais assim..., os meninos estudam né, numa escola... Educação Infantil e tem muito, revisão e num sei que, tarefa, tarefa. Essa escola, era uma proposta diferente, é tanto que nem deu certo assim, durou pouco tempo, era uma escola pequena e tinha vários rituais, eu lembro das festas, tinha a Festa da Primavera, a festa os alunos organizavam, então eu lembro, tenho ótimas lembranças da escola, e, e, ler, escrever, e a professora Luciene que foi a professora que me alfabetizou, maravilhosa também. Eu tenho ótimas lembranças, e por isso, é...hoje, tava até comentando, conversando com um pessoal ontem, eu falei quando eu entro na sala, eu sinto uma conexão tão forte assim, parece que eu me transformo assim, no conteúdo ou no que eu planejei, ou naquela relação com os alunos, eu até tenho que começar a trabalhar menos isso, porque saio esgotada assim, é como se eu, toda minha energia fosse naquele momento, eu me sinto muito bem na escola assim, hoje é um lugar que, eu nunca sairia assim, que eu me reconheço ali, né, ainda tô construindo, né, é constante, essa prática, mas é onde eu me reconheço assim, não me vejo em outro lugar. Aí as leituras que vão me marcar, que é o o Manifesto, o Kafka [risadas], o Processo, Os carbonários, a questão da Ditadura Militar, leitura sobre a ditadura sempre foi muito presente, mas isso um pouquinho mais adolescente assim, né! Leitura de infância, eu não tenho, é essa fala deles, coisas da cidade, num sei quê, de num tolerar injustiça, é isso que me marcou assim [Leitura de luta né?!] É, que aí você lê o outro, que aí eu lia aquelas pessoas, e conversando e a gente vai fazer a revolução e vai ser como e eu lembro disso assim, muito, muito mesmo, foi muito importante, assim, pra mim, assim. É isso!

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