Ana Maria Siqueira Silva
Mãe do Víctor e do Vinícius. Dois gênios artistas, para quem dedico minhas memórias.
[Mestranda em Ensino na Educação Básica pelo CEPAE-UFG .
Pedagoga, graduanda em Filosofia e professora na Educação Básica, nas redes municipal e
estadual em Goiânia, Goiás.]
Tive a honra de ser escolhida pela Karol, para escrever um ensaio de
memórias literárias. Ela não sabe, mas me pediu para afiar uma faca e me
cortar com ela toda e depois, fazer um bolo de chocolate com os retalhos das
minhas carnes. Podem achar que eu estou loucamente exagerando, com
razão, porque é verdade. Esse ano eu realizei o sonho de iniciar o mestrado
que vinha tentando há 10 anos, mas ao mesmo tempo fiquei insana,
desesperada porque minha família entrou em colapso por causa de memórias.
Memórias que para mim eram bonitas, para outras pessoas da minha família
eram terríveis e responsáveis, inclusive, por crises de pânico e terror. As
mesmas memórias, olhadas de pontos de vista diferentes, que se mostraram e
derrubaram nossas estruturas. Desse modo, sem querer, a Karol me colocou
para restaurar memórias positivas e reestabelecer laços memoráveis de
infância comigo mesma e com a minha família.
Primeiramente, pediu-nos para definir memória, mas eu não sei definir.
Talvez porque essa seja uma dessas palavras indefiníveis, porque participam
de um mundo para além do que é físico e que preserva da morte o que é
importante para nós. Talvez seja um dispositivo capaz de trazer o passado de
volta em forma de imagens preservadas em nossa mente e talvez esse
dispositivo tenha a capacidade de, a partir dessas imagens de acontecimentos
que foram reais, criar e imaginar coisas novas para que possamos ver o mundo
de outra forma. Às vezes melhor, às vezes pior, dependendo do nosso estado
de ânimo.
Comumente, o que é memorável o é porque ocorreu em companhia de
outras pessoas. Mas, normalmente, há discrepâncias entre as lembranças dos
mesmos acontecimentos vividos, cada um tem sua memória particular.
Sobre as minhas memórias em relação à formação como leitora, posso
dizer que comecei a frequentar a escola na época da ditadura. Minha
formação, se não foi diretamente influenciada por esse regime, foi
indiretamente, porque meus professores certamente receberam formação mais
tecnicista que a minha. Para acabar de completar, isso se deu numa cidade do
interior de Goiás. Fui formada dentro da mentalidade de que ser professor é
para as pessoas que não conseguiram ser médicas, engenheiras, dentistas,
porque no imaginário das pessoas dessa época , essas profissões mais bem
conceituadas são as que rendem mais dinheiro. No caso das artes e da
música, já seria muito pior: coisa para quem não quer trabalhar.
A Karol me pediu para escolher objetos que contassem minha trajetória
de leitura e eu escolhi uma lamparina (de querosene – aquela que deixa o nariz
cheio de fumaça preta), porque era à luz dessas lamparinas que meu pai e
minha mãe liam à noite pra mim e meus irmãos, como também era à noite, à
luz dessas lamparinas que aconteciam as sessões de contação de histórias,
pelos viajantes e vizinhos, em especial o Seo Florentino, um velhinho
engraçado e contador de histórias, que sempre aparecia em casa e contava
inúmeras histórias inventadas, que nunca se repetiam. Uma caixa (baú) que
tinha múltiplas funções na minha casa, como guardar coisas, móvel que minha
mãe utilizava para passar roupas com ferro a brasa, e mesa de estudos para
mim e meus irmãos, meias, pra leitura ser com os pés quentinhos em dias frios
e de chuva, chocolate, chá, uma janela do lado e, por fim, um dicionário, um
caderno, lápis, borracha e apontador, pequenos objetos que me acompanham
até hoje. Uma ressalva para o dicionário que agora é a internet mesmo.
Escolhi como pessoas importantes na minha trajetória como leitura, meu
pai e meu filho mais velho, o Víctor. Meu pai porque foi a pessoa mais
importante na minha trajetória como leitora. Morávamos na zona rural, quando
eu era pequena e, antes que fosse para a escola (que ele reativou, por meio de
muitos esforços para sensibilizar a comunidade e as autoridades da época), pai
comprou alguns livros infantis, os quais ele e minha mãe liam para mim e meus
irmãos, à noite. Um tempo depois, ele se inscreveu num tipo de “clube do livro”
em uma biblioteca da cidade mais próxima (Silvânia), no qual levava 5 livros e
tinha direito a trocá-los toda semana. Por um bom tempo ele aparecia em casa
com livros diferentes para ler pra gente. Eram livros de literatura infantil,
normalmente os clássicos de Andersen e dos Irmãos Grimm. Líamos à noite à
luz de lamparina, porque meu pai trabalhava durante o dia todo na roça. Ele
também escrevia poemas nessa época e eu achava isso incrível. Ele
participava também de um programa cultural da extinta Caixego, o qual
disponibilizava um álbum de figurinhas e histórias que eram montadas à
medida em que se entregava uma latinha de moedas, juntadas ao longo de um
certo tempo. Meu pai foi uma referência pra mim, por toda a vida, porque
mesmo em uma dificuldade brutal, não perdia o gosto pelas histórias e pelos
poemas. Meu pai me contou que, infelizmente, com a chegada da televisão, o
meu gosto pelas leituras diminuiu drasticamente, quando eu era pequena.
Infelizmente, como minha primeira educação foi no final e logo após a
ditadura, só tive contato com obras clássicas importantes depois que fui para a
faculdade. Costumo dizer que sou filha da ditatura e que, por isso, minhas
leituras são deficientes. Li muito autoajuda e literatura espírita logo depois que
terminei o Ensino Médio. Penso que é porque parei de estudar, me casei e era
a esse tipo de leitura que eu tinha acesso, na época. E, por incrível que pareça,
sinto que essas leituras ajudaram-me a passar por um período espinhoso da
minha vida, que foram 10 anos aproximadamente.
A outra referência é meu filho mais velho, porque ele adora ler e vive
compartilhando suas experiências literárias comigo. Quando ele e o irmão eram
pequenos, eu copiei o hábito do meu pai de ler para eles, todos os dias, antes
que eles dormissem. Lembro-me bem que o livro que eles mais gostaram foi o
“Alice no País das Maravilhas”, de Lewis Carrol. Lemos muitos livros,
principalmente os clássicos (A Pequena Sereia, Cinderela, A Branca de Neve,
A Rainha da Neve, etc) em traduções de versões sem muitas modificações e
mais próximas das originais, que costumam ter finais macabros, inclusive.
Hoje, meu filho é um "devorador de livros", lê muito mais do que eu, coisas
variadas. Já aprendeu sozinho a língua inglesa, lendo livros nesta língua e
procura aprender, também sozinho, outras línguas como o Alemão e o
Japonês. Ou seja, meu filho tornou-se um exemplo de leitor para mim.
Casei-me jovem, com homem que me proibia de estudar e trabalhar.
Mas a sede de conhecimento conseguiu me retirar do “mundo encantado de
Amélia”. Como não havia mais a possibilidade de estudar para um curso como
os mencionados acima, fiz vestibular para Pedagogia, que era um curso que eu
poderia fazer em metade do período e havia ônibus da prefeitura de Silvânia,
cidade onde eu morava, que levava os alunos e buscava em Anápolis, cidade
onde fiz meu curso. Tive a sorte de ter excelentes professores e, ao iniciar o
curso, tive a certeza de que ser professora era o que eu mais queria ser. Nesse
aspecto, as artimanhas do acaso estiveram a meu favor.
Vários livros foram muito importantes para a constituição da pessoa que
sou hoje. Memórias de uma Gueixa, por exemplo, é um livro maravilhoso (narra
em detalhes a formação e os percalços pelos quais uma gueixa passa) que fez
com que eu assimilasse elementos que me proporcionaram forças e
argumentos para levar a cabo o meu divórcio, coisa que foi indispensável para
que eu continuasse viva. Mesmo. O Último Bailarino de Mao, uma
extraordinária autobiografia de Li Cunxim, um bailarino, coreógrafo
respeitadíssimo na atualidade tem um valor emocional especial pra mim,
porque o li assim que
Mas o livro que pegou o meu cérebro e virou do avesso foi Vigiar e
Punir, do Foucault. Li esse livro a pedido de um professor de Filosofia da
Educação, no curso de Pedagogia, em 2003, se não me engano. Eu já havia
entrado em contato com o pensamento marxista, por meio de alguns textos
avulsos e aulas dos professores do curso. É importante ressaltar que na minha
época escolar (Ensino Fundamental e Médio), eu não tive acesso a nenhum
tipo de leitura crítica. Nunca havia estudado Filosofia, Sociologia, não tive aulas
decentes de Artes, no geral. O Ensino Fundametal foi feito até a antiga 3ª série,
na zona rural, em sala multisseriada. Quando meu pai percebeu que minha
aprendizagem estava deficiente, enviou-me para morar com meus avós e
estudar em colégio de freiras. Nessa escola eu tive uma educação de menina.
É, inclusive, interessante ressaltar que no colégio eu conseguia, quase sempre,
tirar as melhores notas da sala. Quando fui para o Ensino Médio, as salas eram
mistas (com rapazes e moças) e, por mais que tentasse, não conseguia de jeito
nenhum alcançar os primeiros lugares. Eles eram sempre dos meninos,
egressos do Ginásio Anchieta, colégio exclusivo para o ensino fundamental ,
antigo 1º grau, dos meninos da cidade, na época.
Disse tudo isso para demonstrar que eu via o mundo, de um certo modo,
como neutro. Acreditava que conseguiria ter uma vida melhor por meio dos
estudos e que quem não conseguia era preguiçoso, não se esforçava, etc.
Portanto, ler Vigiar e Punir foi dilacerador. Foucault faz um histórico da
violência nas prisões, das punições exercidas sobre criminosos ao longo do
tempo, para concluir escancarando o modo como as relações de poder estão
infiltradas em cada instituição social, como somos vigiados uns pelos outros e
pelo estado. Vigiar e Punir mudou a forma como eu vejo o mundo, abriu portas
para a crítica a determinados tipos de leitura (porque eu não sabia selecionar
as minhas leituras) e plantou em mim a necessidade de estudar Filosofia, o que
fez e faz com que eu procure e selecione melhor minhas leituras.
A Karol quis saber quais livros eu tenho em casa e esta foi uma tarefa
bem difícil, porque eu tenho muita coisa e fazer uma lista seria até cansativo.
Portanto, vou citar o que é mais importante para mim, no momento da escrita
deste ensaio. Tenho muita coisa, mas ainda tem muita coisa que eu quero ter.
Estou fazendo minha pequena biblioteca de Filosofia. Já tenho A Política e a
Ética a Nicômaco do Aristóteles, A República de Platão, A Paideia do Jaeger,
Antígone, Édipo Rei, Édipo em Colono, Electra, Agamênon, Os Persas, As
Bacantes, algumas versões da Odisseia e da Ilíada de Homero ( mas nenhuma
do jeito que eu quero, ainda), Alguns livros do Vernant e do Vidal-Naquet, para
a minha pesquisa, algumas obras de Rousseau, Platão, Nietzsche,
Wittgenstein, Hannah Arendt, Kant. Alguns livros infantis de mitologia grega e
alguns pelos quais sou apaixonada ( O Lobo Negro,O Prato Azul Pombinho da
Cora e uns 20 livros que guardo comigo porque acho que são bons para contar
as histórias na sala de aula: ou porque as histórias são boas, mais originais ou
porque podem auxiliar na aquisição do processo de leitura e escrita.
Sobre as minhas leituras da adolescência, tenho a dizer que lia mais na
época das férias. Minha família tinha uma pequena chácara para onde íamos.
Na verdade meu pai morava lá sozinho e minha mãe ficava conosco na cidade.
Aos finais de semana e nas férias íamos para lá. Na adolescência eu não
gostava de ir, então, dava um jeito de não ir aos finais de semana e ficava na
casa da minha avó. Mas nas férias eu não tinha escolha, então pegava livros
na biblioteca ou pedia emprestado ao um tio meu que tinha alguns livros numa
estante. Lembro-me bem de ler Olhai os Lírios do Campo, do Veríssimo, vários
livros da série Vaga-Lume, Meu Pé de Laranja Lima, O Menino do Dedo Verde
de José Mauro Vasconcelos, A Ilha Perdida, Robinson Crusoé, Poliana Menina,
moça e mulher, Memórias de um Gigolô (Marcos Rey - esse livro eu peguei
escondido na estante de um tio meu, depois foi um “bafafá”, porque eu era bem
nova. Os adultos me perguntavam com semblante irônico sobre o que eu
estava achando do livro e eu respondia que era uma história de um dono de
fábrica de carros e que não estava entendendo bem. Mentia e achava que
acreditavam, porque eu ainda não tinha entendido bem o significado da palavra
“gigolô”. O livro era bem grosso e eu só fui entender do meio do livro pra frente.
Depois, logo no 1º ano do Ensino Médio, tornei-me espírita e minhas leituras se
restringiram à literatura deste segmento. Romances, livros explicativos da
doutrina espírita, etc.
Sobre a minha formação leitora na escola, infelizmente não me lembro
de ter nenhuma leitura obrigatória. Estudei em colégio de freiras da 4ª à 8ª
série. Considero que minha educação foi bastante tecnicista. Os professores se
limitavam aos textos do livro didático, que era comprado e precisava ser
“vencido”. Não me lembro nem de visitar a biblioteca da escola, que não era
pequena, mas nunca estava aberta aos alunos. Era restrita às freiras do
colégio.
Em relação às leituras da faculdade, fazia pesquisas para além do que
algum professor tinha solicitado, dependendo do meu interesse. Foi na
faculdade que entrei em contato com as ideias de Marx, Foucault, Altusser,
Saviani, Paulo Freire, etc. Para quem estava acostumada com a literatura paz
e amor, aquilo pra mim foi um soco no estômago. E eu adorei. Mas as
exigências da faculdade não davam muito tempo pra leituras literárias ou
paralelas. Tinha duas crianças pequenas, era bem complicado, inclusive. Mas
entrei na faculdade e saí outra. Quando terminei a faculdade, li toda a
sequência “Crepúsculo” pra descansar a mente, porque meu filho mais novo
queria ler e, na época, minha cunhada me advertiu que era uma leitura pesada,
que se tratava de vampiros. Imaginem que nem na época de término da
faculdade eu ainda não conseguia discernir muito bem literatura clássica de
literatura de massa. A verdade é que eu não sei muito bem quando isso se
deu. Talvez depois que meu filho mais novo começou a se profissionalizar em
ballet clássico, onde entrei em contato com obras clássicas verdadeiras, como
as tragédias preparadas exclusivamente para o Ballet, como Giselle, O
Corsário, La Bayadére, La Fille Mal Gardée e até mesmo O Lago dos Cisnes,
que é a obra mais conhecida nesse segmento. Na Faculdade de Filosofia,
entrei em contato com as obras dos filósofos clássicos, o que também abriu
portas para as tragédias gregas e epopéias, principalmente.
Sobre leituras livres e obrigatórias, na época da escola, lembro-me das
leituras livres, até porque não tive as obrigatórias. Tinha exercícios
intermináveis, obrigatórios. Mas leituras, não. O projeto educacional da ditadura
funcionou bem. Na época da faculdade, penso que as leituras obrigatórias
foram essenciais para o meu ampliar minha visão sobre o mundo e minha
prática pedagógica.
Se pudesse, eu mudaria a minha história de leitura. Teria entrado em
contato com os clássicos desde cedo e me habituado a eles muito antes, para
aproveitá-los, mesmo. Teria lido todas as obras de Shaekespeare, Dostoiévsky
e Machado de Assis. Mas mesmo assim, considero-me leitora, porque sempre
estou lendo alguma coisa. Atualmente estou me dedicando ao mestrado que eu
sonhei em fazer por tanto tempo (mais especificamente 10 anos), então,
dedico-me às leituras referentes ao meu projeto o máximo que posso e tenho
aprendido muito com isso. Não posso deixar de dizer que a disciplina sobre
Metodologia no Ensino de Literatura que fizemos no CEPAE ajudou muito com
o referencial teórico que fundamenta meu estudo, mas também para a vida. A
professora Célia nos ensinou a ler poemas decifrando-os, o que tentei
reproduzir com meus alunos, na leitura da Teogonia e eu acho que funcionou
super bem, apesar de todos os percalços normais no dia a dia de uma escola.
É desafiador saber que ainda existem tantas obras que eu gostaria de
ler. Talvez isto seja um estímulo para a própria preservação da vida, em dias
tão sombrios como os que estamos vivendo na atualidade.
Em sala de aula eu tento ser uma professora melhor do que meus
próprios professores foram comigo. Algumas vezes eu penso que consigo, mas
muitas, não. Contudo, compreendi que os livros devem estar disponíveis para
as crianças, principalmente quando são pequenos e se interessam mais,
porque ainda não criaram aversão. Penso, inclusive, que devemos pensar nos
motivos porque algumas crianças, a maioria talvez, não têm o hábito da leitura.
Portanto, acredito que memória e afetividade influenciam sobremaneira nas
minhas práticas como professora, porque, com certeza, não reproduzo aquilo
que eu penso não ter dado certo comigo, ou que me limitaram como leitora.
Faço questão de levar meus alunos à biblioteca, de dar incentivos aos que
mais leem, de levar gibis e livros para a sala de aula com frequência, leio uma
história todos os dias, mesmo para os maiores (6º ano), tento apresentar
autores consagrados, como Bartolomeu Campos Queirós, Ana Maria Machado,
Silvya Orthof, Ruth Rocha, Manoel Bandeira, Cecília Meireles, dentre outros.
Este texto é escrito em uma época estranha. Utopicamente,
acreditamos, quando jovens em tempo escolar, em uma história linear, na qual
fatos como o avanço tecnológico e o fim da ditadura militar no Brasil prometiam
um futuro livre de preconceitos, numa sociedade em que o conhecimento seria
disponível para qualquer pessoa. Pensávamos, inclusive, que a escola e a
figura do professor seriam dispensáveis, porque cada qual poderia ir em busca
do conhecimento desejado por si mesmo, já que estaria disponível nas redes,
bastaria se dispor a pesquisar. Contudo, ao contrário, vivemos tempos
sombrios em que todas essas supostas conquistas estão ameaçadas por uma
avalanche de notícias falsas na internet, jornais e revistas e as liberdades
individuais conquistadas à custa de suor, sangue e lágrimas por diversos heróis
e revolucionários, sendo ameaçadas por uma onda de facismo e ódio que se
repete não só no Brasil, mas em diversos países do mundo.
Para finalizar, vou replicar aqui, uma postagem que fiz no facebook, em
homenagem aos meus alunos do curso de Pedagogia, que também eram
professores, em 2013 ou 2014. Replico porque essas reflexões, hoje, são mais
atuais que naquela época.
Homenagem aos meus alunos/professores
Sabem porque eu não mudo de profissão devido às condições, muitas vezes,
sub-humanas a que os professores são submetidos? Porque eu acredito que
ser professor é uma das maneiras mais nobres de se viver. Se isto for feito com
dignidade. Porque o conhecimento é a única coisa, que ninguém, nunca,
poderá tirar de mim ou dos meus alunos. Meu sonho é torná-los, através do
conhecimento, LIVRES! Livres para poderem escolher que atitude terão em
relação a cada coisa que a vida cotidiana lhes pede ou lhes impõe. Ser
professor é ter a chave para mudar o mundo! Pena que nós, professores, ainda
não enxergamos isso!
A Alemanha, na época anterior à instauração do nazismo, era um país bastante
desenvolvido no que diz respeito à educação. Como explicar que as pessoas
comuns, indivíduos aparentemente regidos por uma moral, notadamente os
pais de família de comportamento exemplar, mudaram de perspectiva de uma
hora para a outra e aderiram ao nazismo e seus ideais de “raça pura”, tornando
possível um dos fatos mais atrozes e absurdos da humanidade? É
impressionante a facilidade com que o regime se instalou na Alemanha e
causou um fenômeno que levou seres humanos a serem considerados
“supérfluos”. Hitler teve um largo apoio público.
Como, um país com uma educação tão desenvolvida pode se envolver num
movimento que provocou tanta barbárie? Então a educação daquele povo não
serviu pra nada? Qual o papel dos professores nesse processo?
Hannah Arendt diz que as pessoas obedientes são as mais perigosas.
Parece estranha e absurda esta afirmação, mas se considerarmos que os
obedientes são aqueles que seguem as regras estabelecidas por terceiros e
que estas, dependendo da situação, podem ser modificadas, deduzimos que os
seguidores obedientes das normas podem mudar de opinião (postura),
juntamente com as regras. Foi uma situação similar que tornou o nazismo
possível. Parece menos perigosa a maldade das pessoas más e mais
destrutiva a de pessoas comuns, que se colocaram a serviço de uma obra de
destruição de massa, que cometeram crimes secretos e seguiram vivendo em
“paz".
Terminada a última guerra mundial foi encontrada, num campo de
concentração nazista, a seguinte mensagem dirigida aos professores:
“Prezado Professor, Sou sobrevivente de um campo de concentração. Meus
olhos viram o que nenhum homem deveria ver. Câmaras de gás construídas
por engenheiros formados. Crianças envenenadas por médicos diplomados.
Recém-nascidos mortos por enfermeiras treinadas. Mulheres e bebês fuzilados
e queimados por graduados de colégios e universidades. Assim, tenho minhas
suspeitas sobre a Educação. Meu pedido é: ajude seus alunos a tornarem-se
humanos. Seus esforços nunca deverão produzir monstros treinados ou
psicopatas hábeis. Ler, escrever e aritmética só são importantes para fazer
nossas crianças mais humanas."
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